quinta-feira, 26 de agosto de 2010

O fio e as missangas

"A missanga, todos a vêem.

Ninguém nota o fio que, em colar vistoso, vai compondo as missangas.

Também assim é a voz do poeta: um fio de silêncio costurando o tempo".



O texto acima é a citação que abre o livro O fio e as missangas, do escritor moçambicano Mia Couto. Quanta poesia nessas poucas frases! Já gostei do livro, mesmo antes de lê-lo, só por causa delas! A voz do poeta é um fio de silêncio que costura o tempo. E não é isso mesmo? O escritor é aquele que consegue capturar o tempo nas palavras. Aquele capaz de perceber as sutilezas da vida e transformá-las em belas histórias. O fio e as missangas é uma coletânea de contos, de belas histórias, aparentemente simples e ligadas umas às outras pela voz do autor - que não é só sua, mas de todo um povo.
Estou só no começo da leitura. Depois escrevo mais sobre essa leitura que tem sido tão prazerosa.

domingo, 22 de agosto de 2010

Redescobrindo Chico


O poeta Manuel Bandeira em um de seus mais famosos poemas "Evocação do Recife" nos fala sobre o momento em que viu, pela primeira vez, uma "moça nuinha no banho". E chama esse momento de "alumbramento", uma espécie de mistura entre deslumbre, admiração e revelação, descoberta.
Pois há alguns dias eu vivi um momento ao qual, ainda que não na mesma proporção ou materialidade do vivido pelo poeta, eu posso usar a mesma palavra: alumbramento. Eu estava fazendo o que mais faço, dar aula, e pedi aos alunos - na verdade, a maioria da turma era de alunas - abrissem a apostila para lermos um texto a partir do qual fariam uma atividade. Então, li com eles o texto: a letra de uma música de Chico Buarque e Tom Jobim chamada "Eu te amo". Quando terminei a leitura, estávamos eu e a turma alumbrados. 
Não sei se foi o momento, se foi a turma - que é ótima e com a qual tenho grande empatia -, mas ali vivemos a magia do texto literário. O encantamento de versos já conhecidos, ainda que não tenhamos atentado para eles dessa forma.
As letras de Chico Buarque são em si mesmas, desacompanhadas da música, poesia em seu mais alto nível. E eu há tanto tempo que flerto com as composições do Chico, que o conheço da televisão, dos discos que meu primo, uma espécie de irmão mais velho, colecionava em casa quando eu ainda era adolescente, de repente, nessa aula, tenho um encontro com a poesia e com o poeta.
Estou contando essa história para dividir uma coisa que, na verdade, não dá para explicar. Como explicar a magia, o encantamento? Como definir isso em palavras? A verdade é que as palavras são sempre incapazes de expressar e representar com exatidão os sentimentos. No entanto, nós sempre queremos dividir com o outro aquilo que vivemos de bom. Um pouco para ouvirmos, ou lermos, sobre nós mesmos - é o lado egoísta do ser humano - e um pouco para permitir a esse outro viver por tabela a experiência que tivemos.
Abaixo transcrevo a letra da música. Leia em voz alta, pronuncie bem as palavras. Talvez você tenha o seu instante de alumbramento. 

"Ah, se já perdemos a noção da hora
Se juntos já jogamos tudo fora
Me conta agora como hei de partir
Ah, se ao te conhecer
Dei pra sonhar, fiz tantos desvarios
Rompi com o mundo, queimei meus navios
Me diz pra onde é que inda posso ir
Se nós nas travessuras das noites eternas
Já confundimos tanto as nossas pernas
Diz com que pernas eu devo seguir
Se entornaste a nossa sorte pelo chão
Se na bagunça do teu coração
Meu sangue errou de veia e se perdeu
Como, se na desordem do armário embutido
Meu paletó enlaça o teu vestido
E o meu sapato inda pisa no teu
Como, se nos amamos feito dois pagãos
Teus seios ainda estão nas minhas mãos
Me explica com que cara eu vou sair
Não, acho que estás te fazendo de tonta
Te dei meus olhos pra tomares conta
Agora conta como hei de partir".


Voltando à aula, quando termineia leitura, perguntei aos alunos sobre o que estava acontecendo na história contada nos versos. Então, eles disseram que a mulher estava mandando o homem embora. Perguntei se, depois de tudo o que ele diz na letra, ela ainda o mandaria embora e todos concordamos que só se ela fosse louca. Um abraço.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Um país se faz com homens e livros

O título acima é uma citação de um dos mais ilustres escritores brasileiros: Monteiro Lobato. A literatura infantil no Brasil antes de Lobato só podia contar com escritores estrangeiros. O autor de Reinações de Narizinho foi o primeiro a se preocupar aqui com o universo que existe em cada criança. E também com o futuro delas como leitores e escritores. As histórias de Lobato fomentam a imaginação, a fantasia, o sonho e é desse material principalmente que se faz a arte.
Monteiro Lobato é do tempo em que as pessoas se reuniam à noite para discutir e compartilhar leituras de livros, música, teatro. Eram os saraus. Que coisa boa visitar os amigos, reunir-se socialmente e ainda ouvir música ao piano, poemas sendo recitados, trechos da ópera ou do último romance lidos ou comentados por um dos convivas! E ainda dançar, comer e beber!
Hoje não temos mais saraus como esses, mas podemos manter, pelo menos virtualmente, a essência deles: o encanto e a magia oferecidos pela arte. A proposta desse blog é fazer um grande sarau, de que todos os amantes da arte possam participar e virtualmente vivenciar o encantamento cultural de outrora.
Sempre que lemos um bom livro ou assistimos a um filme incrível, por exemplo, queremos falar sobre isso, dividir essa vivência e a nossa admiração pela obra em questão. Se você tem uma experiência marcante de leitura para compartilhar, o espaço para isso é aqui. Espere o convite e poste seu texto.